domingo, fevereiro 25, 2007


Vinicius de Moraes

Samba da Benção

É melhor ser alegre que ser triste
Alegria é a melhor coisa que existe
É assim como a luz no coração

Mas pra fazer um samba com beleza
É preciso um bocado de tristeza
É preciso um bocado de tristeza
Senão, não se faz um samba não

Senão é como amar uma mulher só linda
E daí? Uma mulher tem que ter
Qualquer coisa além da beleza
Qualquer coisa de triste
Qualquer coisa que chora
Qualquer coisa que sente saudade
Um molejo de amor machucado
Uma beleza que vem da tristeza
De se saber mulher
Feita apenas para amar
Para sofrer pelo seu amor
E pra ser só perdão

Fazer samba não é contar piada
E quem faz samba assim não é de nada
O bom samba é uma forma de oração

Porque o samba é a tristeza que balança
E a tristeza tem sempre uma esperança
A tristeza tem sempre uma esperança
De um dia não ser mais triste não

Feito essa gente que anda por aí
Brincando com a vida
Cuidado, companheiro!
A vida é pra valer
E não se engane não, tem uma só
Duas mesmo que é bom
Ninguém vai me dizer que tem
Sem provar muito bem provado
Com certidão passada em cartório do céu
E assinado embaixo: Deus
E com firma reconhecida!
A vida não é de brincadeira, amigo
A vida é arte do encontro
Embora haja tanto desencontro pela vida
Há sempre uma mulher à sua espera
Com os olhos cheios de carinho
E as mãos cheias de perdão
Ponha um pouco de amor na sua vida
Como no seu samba

Ponha um pouco de amor numa cadência
E vai ver que ninguém no mundo vence
A beleza que tem um samba, não

Porque o samba nasceu lá na Bahia
E se hoje ele é branco na poesia
Se hoje ele é branco na poesia
Ele é negro demais no coração

Eu, por exemplo, o capitão do mato
Vinicius de Moraes
Poeta e diplomata
O branco mais preto do Brasil
Na linha direta de Xangô, saravá!
A bênção, Senhora
A maior ialorixá da Bahia
Terra de Caymmi e João Gilberto
A bênção, Pixinguinha
Tu que choraste na flauta
Todas as minhas mágoas de amor
A bênção, Sinhô, a benção, Cartola
A bênção, Ismael Silva
Sua bênção, Heitor dos Prazeres
A bênção, Nelson Cavaquinho
A bênção, Geraldo Pereira
A bênção, meu bom Cyro Monteiro
Você, sobrinho de Nonô
A bênção, Noel, sua bênção, Ary
A bênção, todos os grandes
Sambistas do Brasil
Branco, preto, mulato
Lindo como a pele macia de Oxum
A bênção, maestro Antonio Carlos Jobim
Parceiro e amigo querido
Que já viajaste tantas canções comigo
E ainda há tantas a viajar
A bênção, Carlinhos Lyra
Parceirinho cem por cento
Você que une a ação ao sentimento
E ao pensamento
A bênção Baden Powell
Amigo novo, parceiro novo
Que fizeste este samba comigo
A bênção, amigo
A bênção, maestro Moacir Santos
Que não és um só, és tantos, tantos

como o meu Brasil de todos os santos
Inclusive meu São Sebastião
Saravá! A bênção, que eu vou partir
Eu vou ter que dizer adeus

Ponha um pouco de amor numa cadência
E vai ver que ninguém no mundo vence
A beleza que tem um samba, não

Porque o samba nasceu lá na Bahia
E se hoje ele é branco na poesia
Se hoje ele é branco na poesia
Ele é negro demais no coração

Vinicius de Moraes e Baden Powell

Download em:
http://www.sendspace.com/file/4gzt0t

Baden Powell no violão e Vinicius de Moraes recitando "O Poeta e a Lua"

O poeta e a lua

Em meio a um cristal de ecos
O poeta vai pela rua
Seus olhos verdes de éter
Abrem cavernas na lua.
A lua volta de flanco
Eriçada de luxúria
O poeta, aloucado e branco
Palpa as nádegas da lua.
Entre as esfera nitentes
Tremeluzem pelos fulvos
O poeta, de olhar dormente
Entreabre o pente da lua.
Em frouxos de luz e água
Palpita a ferida crua
O poeta todo se lava
De palidez e doçura.
Ardente e desesperada
A lua vira em decúbito
A vinda lenta do espasmo
Aguça as pontas da lua.
O poeta afaga-lhe os braços
E o ventre que se menstrua
A lua se curva em arco
Num delírio de luxúria.
O gozo aumenta de súbito
Em frêmitos que perduram
A lua vira o outro quarto
E fica de frente, nua.
O orgasmo desce do espaço
Desfeito em estrelas e nuvens
Nos ventos do mar perpassa
Um salso cheiro de lua
E a lua, no êxtase, cresce
Se dilata e alteia e estua
O poeta se deixa em prece
Ante a beleza da lua.
Depois a lua adormece
E míngua e se apazigua...
O poeta desaparece
Envolto em cantos e plumas
Enquanto a noite enlouquece
No seu claustro de ciúmes.

Vinicius de Moraes

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

William Butler Yeats por Carla Bruni

Those dancing days are gone

Come, let me sing into your ear;
Those dancing days are gone,
All that silk and satin gear;
Crouch upon a stone,
Wrapping that foul body up
In as foul a rag:
I carry the sun in a golden cup.
The moon in a silver bag.

Curse as you may I sing it through;
What matter if the knave
That the most could pleasure you,
The children that he gave,
Are somewhere sleeping like a top
Under a marble flag?
I carry the sun in a golden cup.
The moon in a silver bag.

I thought it out this very day.
Noon upon the clock,
A man may put pretence away
Who leans upon a stick,
May sing, and sing until he drop,
Whether to maid or hag:
I carry the sun in a golden cup,
The moon in a silver bag.

William Butler Yeats
(1865-1939)
Poeta irlandês, Prêmio Nobel de Literatura em 1923.
Biografia e poemas traduzidos:

Download da poesia musicada em:

domingo, fevereiro 11, 2007


Federico García Lorca por Paco de Lucía

Anda Jaleo

Yo me alivié a un pino verde
por ver si la divisaba,
y sólo divisé el polvo
del coche que la llevaba.
Anda jaleo, jaleo:
ya se acabó el alboroto
y vamos al tiroteo.

No salgas, paloma, al campo,
mira que soy cazador,
y si te tiro y te mato
para mí será el dolor,
para mí será el quebranto,
Anda, jaleo, jaleo:
ya se acabó el alboroto
y vamos al tiroteo.

En la calle de los Muros
han matado una paloma.
Yo cortaré con mis manos
las flores de su corona.
Anda jaleo, jaleo:
ya se acabó el alboroto
y vamos al tiroteo.

Federico García Lorca

Para fazer download das poesias musicadas basta clicar no link de cada post e depois, no final da página que abrir, apertar em "Download Link: [nome do arquivo.mp3]"

Fernando Pessoa por Blues Etílicos

Liberdade

Ai que prazer
não cumprir um dever.
Ter um livro para ler
e não o fazer!
Ler é maçada,
estudar é nada.
O sol doira sem literatura.
O rio corre bem ou mal,
sem edição original.

Fernando Pessoa
(excerto: Blues Etilícos)


Download em:
http://www.sendspace.com/file/kwgta4

sábado, fevereiro 10, 2007


Bertold Brecht por Nara Leão

Poema da Rosa

"Bertold Brecht, dramaturgo alemão, viveu de 1898 a 1956, legando-nos inúmeras obras de imenso valor. Inconformado com a injustiça social que presenciou e da qual foi vítima durante as duas guerras mundiais que ocorreram em sua época, e que o marcaram profundamente. Serviu e ainda serve de base para a renovação do teatro contemporâneo. De sua peça "Mãe Coragem", traduzida por Augusto Boal, diretor e dramaturgo, foi extraído o poema citado, ganhando nova dimensão com a melodia criada pelo jovem violonista e compositor Macalé." Nara Leão

Há uma rosa linda no meio do meu jardim
Dessa rosa cuido eu, quem cuidará de mim?
De manhã desabrochou, a tarde foi escolhida
pra de noite ser levada de presente à minha amiga

Feliz de quem possui uma rosa em seu jardim
A minha amiga com certeza pensa agora só em mim
Quando sopra o vento frio e o inverno gela o jardim
Eu tenho calor em casa e fico quietinho assim

Feliz de quem tem o seu teto pra ajudar a sua amiga
a fugir do vento ruim que deixa gelado o jardim.

Bertold Brecht
(Tradução: Augusto Boal)

Download em:

Jacques Brel por Nara Leão

La Colombine

"Jacques Brel é um dos mais importantes autores franceses da atualidade. Seu destaque advém de um notável senso crítico e poético, além da maneira pela qual enfrenta com segurança a estrutura comercial da música popular, sobretudo a européia." Nara Leão

Por que essa fanfarra?
Se os homens enfileirados
esperam o massacre
e vão morrer ou matar

por que esse trem sem cores?
Que ronca alto e suspira
para nos conduzir
à tragédia e à mentira

por que a música, o canto?
A multidão que trás flores?
E parece festejar
aqueles que não vão voltar

porque chega o momento
onde termina a infância
e acaba toda a chance
de se viver a paz?

por que o vagão pesado
tão depressa, carregado
de rostos e cores cinzas
que se vão para nunca mais?

por que esse trem de chuva?
por que esse trem guerreiro?
por que esse cemitério em direção à noite?

por que tantos discursos para saudar os mortos?
e sempre as tantas frases feitas no enterro de seus corpos?
por que a criança morta para saudar a vitória?
por que o dia de glória e o sangue derramado?
por que toda essa terra coberta de cinzas e cruzes?
por que toda essa guerra se a pomba ficou ferida?

onde o teu caro rosto desfigurado pela lágrima
enfeiado de desgosto quando limpava nossas armas
e teu corpo sombrio que ao longe desaparece
essa chuva no cais, uma flor nesse túnel
como viver um novo dia se os amigos não voltaram?
onde encontrar alegria? que fazer desse amanhã?

Jacques Brel

Download em:
http://www.sendspace.com/file/8cg46a

Manuel Bandeira por Nara Leão

Azulão

"Manoel Bandeira é sem dúvida o poeta de que mais valeram os compositores na busca de um tema para suas melodias. Talvez pela suave musicalidade imanente aos seus versos. Aqui uma parceria com Jayme Ovalle, das mais perfeitas, se é que assim se possa falar com relação a uma obra de arte." Nara Leão

Vai Azulão
Azulão companheiro vai
Vai ver minha ingrata
Diz que sem ela
O sertão não é mais sertão
Ah, voa, Azulão
Azulão, companheiro vai...

Jayme Ovalle e Manuel Bandeira

Download em:
http://www.sendspace.com/file/hahhrb